Fáscia- A Nova Visão

Vivemos hoje uma renovação de conceitos antigos, já ultrapassados, que viam o sistema biológico de forma mecanicista, unidirecional e específica. Há menos de 30 anos tiramos todo o tecido para analisar somente o sistema músculo-esquelético- em que movimentos, lesões e disfunções eram analisados somente de forma biomecânica. Com a nova visão um mundo de possibilidades se abriu, a visão de tridimensionalidade da fáscia começou a instigar e dar espaço para novos conceitos, que logicamente foram vistos com olhos tortos pela academia científica. 

É natural que o ser humano busque uma resposta 100% objetiva, analítica e específica, mas o que se perdeu no tempo foi a subjetividade e complexidade do corpo humano e todas as suas influências. Como essa complexidade e subjetividade perpassa o desconhecido, o que está fora de controle e longe do campo ocular, é esperado que gere estranheza e principalmente resistência ao novo e às novas possibilidades. 

Por isso o mundo da fáscia se fechou em uma bolha, ficaram de um lado os militantes da fáscia e do outro os militantes da “terapia manual baseada em evidências”. No entanto, precisamos lembrar que antes de um método, conceito ou técnica se tornar científico ele precisa passar pela experimentação. Muitas pesquisas experimentais foram realizadas nas últimas décadas relacionadas ao campo fáscia e esse novo olhar tem tomado espaço dentro de dores tensionais, performance esportiva, postura, percepção interna do indivíduo e inclusive o efeito das emoções e estresse crônico nesse tecido. 

É importante ressaltar que hoje esse campo já não é mais visto somente como um tecido que recobre os outros, mas um sistema independente, que tem vida, toma suas próprias decisões e é responsável por muitas funções no nosso corpo relacionadas aos eventos citados acima. 

Para além disso, atualmente entendemos que os efeitos cognitivos, ou seja, compreender o que está acontecendo no corpo auxilia na busca de resultados, isso é novo e é a parte mais difícil, pois o terapeuta precisa saber passar o conhecimento com conceitos leigos, mas de forma clara e compreensível para que o corpo do indivíduo perceba e receba com abertura essas novas informações. Essa educação tira a autoridade do profissional e passa essa autoridade e autonomia para o indivíduo, o que é inovador no mercado da saúde que foi construído baseado no medo- quando, por exemplo, as pessoas fazem atividade física por medo de ter dor, e não a fazem por desejo de terem mais bem estar. 

Isso também é comum quando falamos em prevenção, dificilmente temos a cultura de buscar a prevenção adequada, a verdadeira investigação da saúde da fáscia, o  cuidado e manutenção adequados para cada indivíduo com sua singularidade, especificidade e autonomia. Essa discussão acabaria por se tornar filosófica, porque pensem comigo, temos uma cultura na área da saúde que baseia o cuidado no medo, o que poderia mudar se educássemos os pacientes para o campo do desejo saindo do campo do medo? 

Conhecimento é poder, poder de escolha, poder de decisão, poder de autopercepção. No mundo da fáscia esse conceito é parecido com o conceito de interocepção, que é a capacidade do indivíduo de perceber o seu mundo interno, algo que parece simples, porém é uma das coisas mais difíceis de fazer quando falamos dos tempos atuais e quando falamos de uma sociedade que romantiza o estresse e alta performance baseada no condicionamento sem raciocínio. O que mudaria então se todos os terapeutas tivessem paciência de explicar os mecanismos fisiológicos para os seus clientes, dessem o poder da saúde pro próprio indivíduo, dessem o poder de escolha e não escolha pra ele? Com certeza sairíamos da esfera condicionada para esfera “dar condições” e abriríamos um novo olhar, menos paternalista e mais responsável pro sujeito que busca de verdade a saúde da sua fáscia. 

Parece muito simples transitar nesses mundos, mas não é, porque para que o sujeito se torne auto responsável é necessário viajar pelas esferas do campo físico, psíquico, emocional, espiritual e todo aquele que afeta o indivíduo de alguma maneira. Ainda tentamos separar nossas esferas, mas isso é impossível e enquanto não integrarmos todas elas, muito provavelmente ficaremos com resultados médios, ou com resultados a curto prazo. Para haver mudança de longo prazo é preciso aprender sobre o corpo, sobre si, sobre todos os campos que podem ou não atuar na dor, postura e performance, e só assim teremos uma verdadeira chance de saúde da fáscia, mesmo que não possamos dar garantias de resultados específicos, esse é o caminho que me parece mais fidedigno e autêntico.

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